quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Enxaqueca atinge cada vez mais crianças

Não existe ainda uma estatística nacional sobre a dor de cabeça na criança. O mais comum é a enxaqueca, que pode durar menos tempo do que nos adultos e aparece como uma dor bilateral.

Confira matéria do jornal Bom Dia Brasil, que conta com entrevista da neurologista e especialista em enxaqueca e dor de cabeça infantil, Carla Jevoux, presente no portal Globo.com.



Dor de cabeça em crianças deve ser tratada desde muito cedo

Mais comum do que se imagina, a enxaqueca infantil atinge mais de 10% das crianças com idade entre 7 e 15 anos, e pode ser responsável pelo baixo rendimento escolar. Tratamento preventivo das crises pode levar à diminuição e descontinuidade do quadro doloroso na idade adulta

Muitas crianças se queixam de dores de cabeça constantes e os pais costumam ficar de mãos atadas, sem saber o que fazer e em que momento o sintoma é realmente preocupante, já que, em geral, a criança não consegue expressar bem a intensidade da dor. O caso se torna realmente preocupante quando o rendimento escolar e até mesmo atividades rotineiras, como correr, brincar e pular são deixadas de lado pelos pequenos em razão da dor, que pode ser caracterizada como um quadro clínico de enxaqueca.

Recentemente, um estudo epidemiológico brasileiro, realizado com 538 estudantes com idade entre 10 e 18 anos, constatou que 11% das crianças de até 15 anos têm enxaqueca. Durante a infância, a chamada cefaleia deve ser analisada de acordo com o desenvolvimento intelectual da criança, já que existe grande dificuldade para ela expressar e caracterizar adequadamente o sintoma doloroso. Porém, é fundamental que os pais não menosprezem qualquer tipo de reclamação de dor dos filhos, pois elas podem revelar algum tipo de estresse, gripe ou resfriado, bem como doenças mais graves, como infecções no sistema nervoso, problemas renais ou circulatórios, e até mesmo um tumor.

De acordo com a neurologista Carla Jevoux, especialista no tratamento das dores de cabeça crônicas, os motivos das crises de enxaqueca são muito variados. Problemas de alimentação, horas em frente à televisão, computador ou videogame, associadas à diminuição das horas de sono podem desencadear a dor. “Tanto na infância quanto na adolescência, a enxaqueca é a dor de cabeça que causa maior sofrimento, já que as crises costumam ser bastante intensas”, acrescenta.

A médica chama atenção para o fato de que, até os 12 anos, a frequência das dores é similar em ambos os sexos, mas, após essa idade, os casos aumentam rapidamente nas meninas. A proporção passa a ser, então, de três mulheres para cada homem apresentando crises frequentes de enxaqueca. Nos meninos, as crises têm pico de incidência na pré-adolescência, enquanto, nas meninas, elas são mais comuns no final da adolescência, sendo que novos casos de enxaqueca geralmente só ocorrem após a segunda década de vida.

- Na adolescência e em adultos jovens, há remissão espontânea das crises de enxaqueca em cerca de 60% dos casos. Isso justifica o fato de que, na população infanto-juvenil, o tratamento preventivo pode ser realizado por um tempo mais curto, pois o quadro doloroso pode se extinguir espontaneamente – ressalta a Drª Carla Jevoux.

Como diagnosticar e tratar a enxaqueca infantil

Casos crônicos de enxaqueca podem levar a criança a ter crises de vômito, dor abdominal e até vertigem. Esses sintomas são mais comuns em meninas, acontecendo em cerca de 60% dos casos de dor, do que em meninos, nos quais apenas 41,7% dos que apresentam enxaqueca têm algum sintoma visível. “Por ser uma doença hereditária, a maioria dos pais de crianças que também apresentam cefaleia são capazes de reconhecer alguns fatores desencadeantes por experiência própria”, lembra a neurologista.

A síndrome dos vômitos crônicos acontece, normalmente, em crianças de quatro a 10 anos, sendo caracterizada por náuseas recorrentes e posterior desaparecimento total dos sintomas. Estima-se que 80% das crianças com vômitos cíclicos apresentem também dor abdominal e enxaqueca. Outro sintoma, a migrânea abdominal, também chamada de enxaqueca abdominal, se manifesta com dores intensas localizadas, geralmente, na linha média do abdome, também com completo desaparecimento dos sintomas entre as crises. Essas dores têm seu pico entre os cinco e os 10 anos de idade, acometendo mais as meninas. Mais um sintoma que costuma acompanhar as crises de enxaqueca dos pequenos são episódios recorrentes e breves de vertigens, aparentemente sem explicação.

A orientação médica, nos casos em que a enxaqueca infantil é diagnosticada, é de medidas profiláticas, como forma de evitar as crises. Numerosos fatores podem desencadear a enxaqueca na criança e devem ser evitados, como o consumo frequente de alimentos com conservantes em excesso, gordurosos, cítricos, embutidos, leite e derivados, adoçantes artificiais, chá e refrigerantes, bem como jejum prolongado, problemas no sono, excesso de atividades extracurriculares, alterações emocionais, barulho excessivo e exposição ao sol ou a odores fortes, como cigarro, perfume e tinta.

Se não for possível prevenir, a crise deve ser tratada. Para isso, a indicação da especialista é de repouso em um ambiente silencioso e com pouca luminosidade e um breve período de sono. “Na infância, essas atitudes são mais fáceis de serem adotadas do que na idade adulta e, quando eficazes, devem ser encorajadas. Com isso, é possível evitar a utilização excessiva de medicação analgésica”, analisa.

- As crianças com enxaqueca geralmente não necessitam de medicamentos para suas crises, que costumam melhorar significativamente apenas com repouso em um lugar calmo, que facilite o sono. Pode ser recomendado o uso de um analgésico comum para acelerar a resolução das crises e antieméticos para a náusea e vômitos, sendo que o tratamento sintomático deve ser utilizado de três a quatro dias ao mês, no máximo.

O mais importante, segundo a neurologista, é frisar que a enxaqueca, por se tratar de uma doença bioquímica do cérebro, transmitida geneticamente, não pode ser curada. No entanto, tratamentos corretos e eficientes podem reduzir sua incidência, intensidade e a duração das crises em mais de 90%. Com o passar do tempo, especialmente quando os casos são prevenidos e tratados ainda na infância, as crises de dor podem desaparecer sozinhas.

Sobre a especialista:
Dra. Carla Jevoux – neurologista
Graduada em Medicina pela Fundação Oswaldo Aranha/Escola de Ciências Médicas de Volta Redonda, a Drª Carla Jevoux tem especialização em Neurologia pelo Instituto de Pós Graduação Médica Carlos Chagas, do Hospital da Beneficência Portuguesa, no Rio de Janeiro, e mestrado e doutorado em Neurologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). É médica do Ambulatório de Investigação em Cefaleias do Hospital Universitário Antônio Pedro, da UFF, e secretária da Sociedade Brasileira de Cefaleia. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Neurologia, atuando principalmente nos seguintes temas: cefaleia, traumatismo crânio-encefálico, migrânea, cefaleia pós-traumática crônica e neoplasia.

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